Medidas protetivas e o princípio da gravitação jurídica

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O princípio da gravitação jurídica enuncia que tudo aquilo que é acessório deve seguir o que é principal. O Código de Processo Penal encampou tal princípio ao, por exemplo, estabelecer a prevenção como critério definidor de competência, determinando, em seu art. 83, que, num contexto de dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, sempre que um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa, será competente o primeiro juiz.

Essa adoção do princípio da gravitação jurídica também irradia efeitos em outros institutos do Processo Penal para além da prevenção. A título de exemplo, imaginemos um cenário em que uma mulher, alegando-se vítima de violência doméstica, registra boletim de ocorrência contra alguém e requere medidas protetivas. O Ministério Público, então, atentamente, representa ao Poder Judiciário pela concessão de tais medidas e a Justiça as concede. Ocorre que, pouco tempo após o fato criminoso, antes mesmo das investigações serem concluídas (portanto, antes do oferecimento e do recebimento da denúncia), a mulher vai até a Delegacia e manifesta expressamente que quer se retratar da representação feita contra o seu ofensor.

Ora, sabemos que a representação é condição de procedibilidade nas ações penais públicas condicionadas à representação, de maneira que, sem a representação, o inquérito não pode ser sequer iniciado (CPP, art. 5º, § 4º) ou, nos casos em que já fora iniciado, se no transcurso a representação for retratada, a punibilidade deve ser extinta por decadência (CP, art. 103 e art. 107, VI). Sabe-se, ainda, que, regra geral, a representação pode ser retratada até o oferecimento da denúncia (CP, art. 102) e, nos casos específicos da Lei Maria da Penha, pode ser retratada até o recebimento da denúncia, desde que, após a retratação da vítima antes do recebimento da denúncia, o Juízo a confirme em audiência própria para tal, ouvindo-se apenas a vítima, sem a presença do ofensor (Lei nº 11.340/2006, art. 16).

Assim sendo, se a retratação oportuna significará a extinção da punibilidade no inquérito, que é o principal, certo é que, pelo princípio da gravitação jurídica, essa extinção da punibilidade deve gerar, automaticamente, a revogação de qualquer medida protetiva ainda pendente.

Mas não é só. Defendemos que, mesmo nos casos em que a representação é feita e não é retratada, se o Poder Judiciário decretar medidas protetivas e depois revogá-las por quaisquer motivos ou mesmo se decretá-las com prazo de validade, uma vez findo o prazo de validade ou operada a revogação, o Poder Judiciário não pode mais decretá-las em relação aos fatos objeto daquele inquérito ou ação penal. É dizer: se o investigado/acusado supostamente voltar a agredir ou ameaçar a vítima, disso deve se instaurar um novo inquérito, no qual, aí sim, a vítima pode pedir novas medidas protetivas que, se deferidas, respeitarão ao princípio da gravitação jurídica, pois serão acessórias desse novo inquérito/processo e não do inquérito/processo anterior.

Num dado caso concreto em que atuei, o Poder Judiciário fixou medidas protetivas com prazo de validade. Expirado o prazo, as medidas se revogaram automaticamente. Contudo, realizada a audiência de instrução e julgamento anos após o fato (por demora do Poder Judiciário), o Ministério Público, sem qualquer pedido da vítima (o MP tem legitimidade legal para fazê-lo, mas fazê-lo sem solicitação da vítima reforça a fragilidade do pleito), apenas considerando-a “vulnerável”, decidiu pedir novamente a decretação de medidas protetivas, sem que houvesse a prática de qualquer fato novo que pudesse ensejá-las como acessórias em eventual inquérito/processo apurador desse fato novo.

Diante disso, nós, como defesa, pedimos a palavra e nos manifestamos perante o Poder Judiciário. Essa manifestação pode ser conferida no vídeo abaixo:


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