Muitos já ouviram falar no ditado “achado não é roubado” e acreditam que, por exemplo, ao acharem algo perdido por terceiro, podem ficar com a coisa e não terão nenhum tipo de problema criminal. Cuidado! Não é bem assim que funciona o Direito…
Embora realmente “achado” não configure o crime de roubo (pois esse exige a prática de violência e/ou grave ameaça e a subtração de coisa alheia móvel), certo é que ficar com aquilo que não te pertence pode sim configurar crime e render até mesmo uma pena privativa de liberdade (prisão), além de multa.
Para entender isso, vamos diferenciar os crimes de apropriação indébita simples, apropriação de coisa achada e apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza.
APROPRIAÇÃO SIMPLES
O Código Penal do Brasil prevê, em seu art. 168, o crime de apropriação indébita na sua modalidade simples:
Art. 168 – Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:
Código Penal
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
O crime de apropriação indébita na sua forma simples consiste na conduta daquele que, tendo a coisa consigo de maneira inicialmente legítima, decide, após isso, dela se apropriar, agindo como se fosse dono da coisa, seja negando restituí-la ao seu legítimo dono, seja alienando-a a título gratuito (doação) ou oneroso (venda), seja destruindo-a.
Assim sendo, comete apropriação indébita na forma simples, por exemplo, aquele sujeito que tem consigo um telefone celular que foi emprestado por um amigo e que, após isso, após ter o celular em mãos, decide se apropriar dele, seja negando restituir o aparelho ao dono, seja doando-o, vendendo-o ou destruindo-o.
Note-se que, para a configuração da apropriação indébita, é imprescindível que a posse da coisa seja passada da vítima para o agente de maneira intencional e que o agente atue sem má-fé prévia. É que, se a posse da coisa não for passada intencionalmente e sim subtraída, teremos o crime de furto (ou de roubo, se haver violência e/ou grave ameaça) e, por outro lado, se a posse da coisa for passada por vontade da vítima, mas o agente estiver induzindo-a a erro para isso, teremos o crime de estelionato.
APROPRIAÇÃO DE COISA ACHADA
O crime de apropriação de coisa achada está previsto no art. 169, II, do Código Penal, com uma pena de detenção de 1 (um) mês a 1 (um) ano e multa para “quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente, dentro no prazo de quinze dias”.
Comete esse crime a pessoa que, por exemplo, está andando pela rua quando vê uma carteira ou um celular perdidos por alguém, pegando a coisa e deixando de entregá-la ao legítimo dono ou no mínimo à autoridade competente no prazo de 15 (quinze) dias. A tal coisa perdida é chamada no Direito de res deperdita.
Fica nítido, portanto, que se um dia você achar algo na rua, as suas opções legais, para não cometer crime, são apenas as seguintes: 1ª) ignorar a coisa e seguir com a sua vida normalmente, deixando a coisa onde ela está; 2ª) pegar a coisa e procurar pelo dono, entregando a ele no prazo de até 15 (quinze) dias; 3ª) entregar a coisa perante as autoridades públicas (Delegacia de Polícia Civil mais próxima, no caso) no prazo de até 15 (quinze) dias.
Ainda, se você cumprir o que manda a lei e entregar a coisa à pessoa ou à autoridade pública, terá direito de pedir ao dono da coisa uma recompensa de no mínimo 5% (cinco porcento) do valor da coisa, além das despesas que você eventualmente tiver com a conservação e o transporte da coisa, conforme prevê os arts. 1.233 e 1.234 do Código Civil:
Art. 1.233. Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor.
Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente.
Art. 1.234. Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá direito a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, e à indenização pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la.
Parágrafo único. Na determinação do montante da recompensa, considerar-se-á o esforço desenvolvido pelo descobridor para encontrar o dono, ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de encontrar a coisa e a situação econômica de ambos.
Código Civil
Vale considerar, ainda, que não haverá crime nem obrigação de restituir se a coisa, em vez de perdida, tiver sido efetivamente abandonada pelo legítimo dono. Nesse caso, chamamos a coisa de res derelicta.
APROPRIAÇÃO DE COISA HAVIDA POR ERRO, CASO FORTUITO OU FORÇA DA NATUREZA
Por fim, destacamos o art. 169 do Código Penal, que prevê o crime de apropriação de coisa havida por erro, caso fortuito ou força da natureza:
Art. 169 – Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou força da natureza:
Código Penal
Pena – detenção, de um mês a um ano, ou multa.
Assim sendo, pratica o crime acima a pessoa que, por exemplo, se apropria de um dinheiro que caiu na sua conta por engano (erro), ou mesmo de um objeto trazido à sua casa por força da ventania ou chuvas (força da natureza), pois a lei, mesmo nesses casos, impõe o dever de devolver o bem (seja dinheiro ou não) ao legítimo dono ou, na sua impossibilidade, entregá-lo às autoridades públicas (Delegacia de Polícia Civil, no caso).
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