1. CONCEITO
Medida de segurança é a “sanção penal imposta pelo Estado, na execução de uma sentença, cuja finalidade é exclusivamente preventiva, no sentido de evitar que o autor de uma infração penal que tenha demonstrado periculosidade volte a delinquir” (CAPEZ, 2020, p. 584).
2. FINALIDADE
A finalidade da medida de segurança é exclusivamente preventiva e nunca punitiva, porque visa tratar o inimputável e o semi-imputável que demonstraram, pela prática delitiva, potencialidade para novas ações danosas.
3. AS MEDIDAS DE SEGURANÇA VALEM PARA TODOS OS INIMPUTÁVEIS?
Quando tratamos, neste tópico, sobre medidas de segurança, estamos nos referindo aos inimputáveis que assim o sejam por doença mental etc. e não por menoridade. Aos menores de 18 (dezoito) anos que praticarem fatos análogos a crimes, a consequência é a aplicação de medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que não se confundem com medidas de segurança.
4. SISTEMAS
Existem 2 sistemas possíveis para as medidas de segurança:
i) sistema vicariante: admite pena ou medida de segurança, mas nunca ambas cumulativamente;
ii) sistema duplo binário: admite pena e medida de segurança, cumulativamente.
O Código Penal adotou o sistema vicariante, de modo que, no nosso ordenamento jurídico, é impossível a cumulação de pena com medida de segurança.
- Aos imputáveis, aplica-se pena.
- Aos inimputáveis, aplica-se medida de segurança.
- Aos semi-imputáveis, aplica-se pena (com redução de 1/3 a 2/3) ou medida de segurança, dependendo da recomendação do perito (se existir periculosidade, aplica medida de segurança; se não, aplica pena reduzida).
5. PRESSUPOSTOS DAS MEDIDAS DE SEGURANÇA
São dois os pressupostos:
i) prática de fato típico + fato ilícito;
ii) potencialidade para novas ações danosas, manifestada pela própria doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, potencialidade essa que pode ser presumida ou deve ser constatada:
a) na inimputabilidade, a potencialidade danosa é presumida;
b) na semi-imputabilidade, a potencialidade danosa deverá ser constatada com base em laudo.
ATENÇÃO: a potencialidade para novas ações danosas deverá ser constatada por exame próprio de cessação da periculosidade, por laudo fundamentado precisamente, concluindo expressamente se permanece ou não a periculosidade (vale lembrar que, obviamente, o fato antecede ao exame, de modo que, entre o fato e a data de realização do exame, pode ocorrer a cessação da periculosidade).
6. ESPÉCIES DE MEDIDA DE SEGURANÇA
São duas as espécies:
i) medida de segurança detentiva: é a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.
ii) medida de segurança restritiva: é a sujeição a tratamento ambulatorial, em que a pessoa se apresenta em local próprio para atendimento.
- CP, art. 97.
7. MEDIDA DE SEGURANÇA DETENTIVA
7.1. CARACTERÍSTICAS
As características da medida de segurança detentiva são as seguintes:
i) é obrigatória quando a pena imposta for a de reclusão;
ii) será por tempo indeterminado (o que não significa que será eterna, conforme veremos), perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade;
ATENÇÃO: SÚMULA Nº 527 DO STJ: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”.
iii) a cessação da periculosidade será averiguada após um prazo mínimo, variável entre 1 (um) e 3 (três) anos;
iv) a averiguação pode ocorrer a qualquer tempo, mesmo antes do término do prazo mínimo, se o juiz da execução determinar (LEP, art. 176).
7.2. LOCAL DE INTERNAÇÃO
O local de internação será estabelecimento dotado de características hospitalares (CP, art. 99) e, na falta de vaga, pode ser em hospital comum ou particular, mas nunca em cadeia pública, sob pena de constrangimento ilegal (atacável, portanto, via habeas corpus e, dependendo, até mesmo indenizável).
7.3. DESINTERNAÇÃO
Se cessar a periculosidade do indivíduo, constatada mediante exame psiquiátrico próprio, poderá ser desinternado.
Contudo, caso o indivíduo, antes do decurso de 1 (um) ano, pratique fato que indique sua periculosidade (não necessariamente crime), poderá ser restabelecida a situação anterior de internação.
7.4. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDA DE SEGURANÇA DETENTIVA EM CRIME APENADO COM DETENÇÃO
Como já visto, a medida de segurança detentiva consiste na internação do sujeito em algum estabelecimento. Como também já estudamos, a pena de detenção admite, no máximo, regime inicial semiaberto, não admitindo regime inicial fechado.
Dito isso, pergunta-se: seria incompatível a aplicação de medida de segurança detentiva (internação) em crime apenado com detenção?
A resposta, como quase tudo no Direito, é “depende”… Nesses casos, a medida de segurança de tratamento ambulatorial é facultativa, mas é possível, cabendo ao juiz decidir observando o maior ou menor potencial de periculosidade do indivíduo.
Assim, temos:
i) nos crimes apenados com reclusão, a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrica é obrigatória, não podendo ser aplicada a medida de segurança restritiva (tratamento ambulatorial);
ii) nos crimes apenados com detenção, a internação é facultativa, sendo cabível, dependendo da periculosidade do indivíduo, a internação ou o tratamento ambulatorial.
8. MEDIDA DE SEGURANÇA RESTRITIVA
8.1. CARACTERÍSTICAS
As características da medida de segurança restritiva são as seguintes:
i) se o fato é punido com detenção, o juiz pode submeter o agente a tratamento ambulatorial;
ii) o tratamento ambulatorial será por prazo indeterminado até a constatação da cessação da periculosidade;
iii) a constatação será feita por perícia médica após o decurso do prazo mínimo;
iv) o prazo mínimo varia entre 1 (um) e 3 (três) anos;
v) a constatação pode ocorrer a qualquer momento, até antes do prazo mínimo, se o Juiz da Execução determinar (LEP, art. 176).
8.2. LOCAL DE TRATAMENTO AMBULATORIAL
O local de tratamento ambulatorial será aquele em que a pessoa se apresentará durante o dia, onde receberá assistência médica, como se fosse uma “consulta”.
8.3. CONVERSÃO DO TRATAMENTO AMBULATORIAL EM INTERNAÇÃO
O juiz pode converter o tratamento ambulatorial em internação, se essa providência for necessária para fins curativos.
Contudo, o juiz não pode converter a internação em tratamento ambulatorial.
- CP, art. 97, § 4º
9. SEMI-IMPUTÁVEL (CP, ART. 98)
Para o semi-imputável, há duas opções para o juiz, considerando-se o laudo do perito:
1ª) o juiz aplica-lhe pena, reduzida de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços);
2º) o juiz substitui a pena por medida de segurança.
10. INIMPUTABILIDADE E MEDIDA DE SEGURANÇA
Já vimos que a inimputabilidade se dá em 3 (três) casos, que terão consequências distintas, conforme a tabela abaixo:
MOTIVO DA INIMPUTABILIDADE | CONSEQUÊNCIA |
doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado | aplica-se medida de segurança |
menoridade | não se aplica medida de segurança, mas sim as medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) |
embriaguez completa e involuntária, acidental e proveniente de caso fortuito ou força maior (ex. tropeça e cai em tonel de vinho ou é coagido a consumir droga) | não se aplica medida de segurança, pois é o caso de absolvição própria (CP, art. 28) |
11. APLICAÇÃO PROVISÓRIA DA MEDIDA DE SEGURANÇA
Não é possível a aplicação provisória da medida de segurança, mas a internação provisória, a título de medida cautelar diversa da prisão, é possível e, se aplicada, será computada de eventual medida se segurança posteriormente aplicada:
- CPP, art. 319, VII:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (…) VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração.
Código de Processo Penal
12. COMPETÊNCIA PARA REVOGAR A MEDIDA DE SEGURANÇA
A competência para revogar a medida de segurança é do Juiz da Execução.
13. MEDIDA DE SEGURANÇA E A DETRAÇÃO
Na sentença, o juiz deve fixar um prazo mínimo de duração da medida de segurança, que, como já visto, será entre 1 e 3 anos.
Computa-se nesse prazo mínimo, pela detração, o tempo de prisão provisória, o de prisão administrativa e o de internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou estabelecimento adequado.
- CP, arts. 41 e 42.
14. MEDIDA DE SEGURANÇA E PRESCRIÇÃO
A medida de segurança está sujeita à prescrição, havendo entendimentos de que:
1) o prazo prescricional será calculado com base no mínimo abstrato cominado ao delito cometido pelo agente;
2) STJ: o prazo prescricional será calculado com base no máximo da pena abstratamente cominada;
3) em se tratando de medida de segurança substitutiva (aquela que se dá em substituição à pena privativa de liberdade, quando o agente, no curso da execução, é acometido por doença ou perturbação mental), o prazo de prescrição será calculado sobre o restante da pena.
15. CONVERSÃO DA PENA EM MEDIDA DE SEGURANÇA
Se, durante a execução da pena privativa de liberdade, o condenado é acometido por doença ou perturbação mental, poderá haver a conversão dessa pena em medida de segurança, que não poderá ter duração perpétua, ficando limitada ao restante da pena privativa de liberdade ainda não cumprida.
- LEP, art. 183;
- STJ, súmula nº 527
16. TEMPO MÁXIMO DA MEDIDA DE SEGURANÇA
A medida de segurança, como já visto, não poderá ser eterna. Assim sendo, não poderá ultrapassar o tempo máximo de cumprimento de pena privativa de liberdade prevista no Brasil, de acordo com o art. 75 do Código Penal.
- Antes do pacote anticrime: 30 anos
- Depois do pacote anticrime: 40 anos
Caso a doença mental e a periculosidade do indivíduo permaneçam após a sua liberação, nada poderá ser feito na esfera penal, mas o Ministério Público poderá buscar a internação do indivíduo na esfera cível, mediante processo de interdição.
- CPP, art. 682, § 2º
REFERÊNCIAS
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: 24ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020 – versão digital.
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