CONCEITO
Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
A legítima defesa é uma causa de exclusão da ilicitude que consiste em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios necessários.
Não há, na legítima defesa, “uma situação de perigo pondo em conflito dois ou mais bens, na qual um deles deverá ser sacrificado. Ao contrário, ocorre um efetivo ataque ilícito contra o agente ou terceiro, legitimando a repulsa” (CAPEZ, 2020, p. 525).
FUNDAMENTO
O Estado não é onipresente. As polícias também não o são. Assim, não tendo condições de oferecer proteção integral aos cidadãos em todos os lugares e em todos os momentos, o Estado permite a esses que se defendam por conta própria quando não houver outro meio.
NATUREZA JURÍDICA
A legítima defesa é causa de exclusão da ilicitude.
REQUISITOS
São vários os requisitos da legítima defesa, quais sejam:
AGRESSÃO INJUSTA
Segundo Fernando Capez, agressão é “toda conduta humana que ataca um bem jurídico. Só as pessoas humanas, portanto, praticam agressões. Ataque de animal não a configura, logo, não autoriza legítima defesa”, mas sim estado de necessidade (CAPEZ, 2020, p. 526).
ATENÇÃO PARA A EXCEÇÃO: se o animal ataca por ordem de um ser humano, nesse caso teremos uma agressão que autoriza a legítima defesa, pois o animal está sendo utilizado como instrumento do crime ordenado pelo humano.
DESAFIO PARA LUTA – DUELO: “não age em legítima defesa a pessoa que aceita desafio para luta, duelo, convite para briga, respondendo os contendores pelos ilícitos praticados” (CAPEZ, 2020, p. 526).
EXISTE AGRESSÃO JUSTA? Sim, valendo notar que a legítima defesa só se autoriza em razão de agressão injusta. A agressão justa é aquela que está de acordo com o ordenamento jurídico, como por exemplo a conduta de um policial militar que, mesmo após dar sucessivas ordens de parada a alguém, é forçado progressivamente e moderadamente de força física para imobilizar uma pessoa.
A AGRESSÃO INJUSTA NECESSITA SER UM CRIME? Não. É possível valer-se de legítima defesa contra uma agressão injusta que não seja necessariamente um crime, como, por exemplo, nos casos em que a pessoa se defende para a proteção de sua posse (Código Civil, art. 1.210, § 1º – “desforço imediato”) ou contra o furto de uso (que não é crime), o dano culposo (que também não é crime, pois existe somente o crime de dano doloso) etc.
A INJUSTIÇA DA AGRESSÃO DEVE SER AFERIDA DE FORMA OBJETIVA – LEGÍTIMA DEFESA VALE ATÉ MESMO CONTRA INIMPUTÁVEL: para saber se a agressão é injusta, basta uma análise objetiva, pouco importando a capacidade/imputabilidade do agente que pratica a agressão. Assim, caso um inimputável (doente mental, menor de 18 anos etc.) pratique uma agressão injusta, de nada importa o seu estado de inimputabilidade, pois poder-se-á usar de legítima defesa para se defender contra essa agressão.
PROVOCAÇÃO DO AGENTE
Se o agente meramente provocar o outro, somente a provocação de maior gravidade poderá ser considerada como injusta agressão apta a autorizar a legítima defesa, como no caso de uma injúria grave. Por outro lado, meras brincadeiras de mau gosto, desafios tolerados no meio social etc. não autorizarão a legítima defesa.
De qualquer modo, sempre deverá ser observado o requisito da moderação, de modo que não pode alguém matar outra pessoa somente porque sofreu uma injúria, ainda que grave, embora pudesse, por exemplo, usar de força para tapar a boca de alguém que, incessantemente e gravemente, prosseguisse nas injúrias graves.
O PROVOCADOR PODE INVOCAR A LEGÍTIMA DEFESA? Em regra, não, haja vista que não pode invocar legítima defesa quem deu causa aos acontecimentos, exceto, é claro, se se defender de eventual excesso por parte daquele que foi provocado.
AGRESSÃO ATUAL OU IMINENTE
Atual é o que está ocorrendo, ou seja, o efetivo ataque já em curso no momento da reação defensiva.
Iminente é o que está prestes a ocorrer, caso em que a lesão ainda não começou a ser produzida, mas é possível de se iniciar a qualquer tempo, daí porque admite-se a legítima defesa ainda nesses casos, já que ninguém é obrigado a esperar até que seja atingido para defender-se (nemo expectare tenetur donec percutietur) (CAPEZ, 2020.
LEGÍTIMA DEFESA EM CRIMES PERMANENTES: é possível a qualquer tempo, haja vista que a agressão também é permanente, eis que a conduta se protrai no tempo, renovando-se a todo instante a sua atualidade, de modo que, por exemplo, a vítima de cárcere privado pode defender-se a qualquer tempo.
LEGÍTIMA DEFESA E AGRESSÃO FUTURA: diferente da agressão iminente, não se admite legítima defesa de agressão futura, como no caso de alguém que ameaça matar outro de morte (mal futuro).
LEGÍTIMA DEFESA E AGRESSÃO PASSADA: igualmente, se a agressão é passada, também não haverá legítima defesa, mas sim vingança.
AGRESSÃO A DIREITO PRÓPRIO OU DE TERCEIRO
Conforme o caso, teremos:
i) legítima defesa própria, caracterizando-se pela defesa de direito próprio;
ii) legítima defesa de terceiro, caracterizada pela defesa de direito alheio.
É POSSÍVEL AGREDIR O TERCEIRO PARA DEFENDÊ-LO? Sim, é possível falar-se em legítima defesa de terceiro, ainda que se agrida o próprio terceiro, como no caso, por exemplo, de alguém que, mediante força, imobiliza o suicida para impedir que ele ponha fim à própria vida.
LEGÍTIMA DEFESA DA HONRA
Todos os direitos são suscetíveis de legítima defesa, seja a vida, a liberdade, a integridade física, o patrimônio e até mesmo a honra etc., bastando que tal direito cogitado seja tutelado pela ordem jurídica.
Contudo, nem sempre é proporcional a legítima defesa da honra. Por exemplo, não pode alguém, em nome da honra, matar outra pessoa, ante a manifesta ausência de moderação (CAPEZ, 2020).
ADULTÉRIO: atualmente, não se admite mais matar em razão do adultério sob a pseudojustificativa de legítima defesa. É que há manifesta desproporção entre a suposta violação à honra e a reação de matar aquele que a violou. Caso queira, o indivíduo pode buscar reparação na esfera civil (indenização), mas nunca matar o outro em razão de adultério. Para além disso, há situações em que a legítima defesa da honra não se admite também por outro motivo: é que a honra é atributo personalíssimo, não podendo, por exemplo, o marido matar o amante de sua esposa, já que quem lhe ofendeu a honra foi a esposa, e não o amante, afinal, o pacto de fidelidade existente era entre o marido e a esposa.
INCONSTITUCIONALIDADE NO CASO DE FEMINICÍDIO: recentemente, o STJ, julgando a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 779, declarou inconstitucional a tese de legítima defesa da honra em casos de feminicídio, de maneira que tal tese não pode ser admitida pelo juiz togado e muito menos pode sequer ser arguida perante o Tribunal do Júri, que tem a competência constitucional para julgar os crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.
MEIOS NECESSÁRIOS
Segundo Fernando Capez, meios necessários são os “menos lesivos colocados à disposição do agente no momento em que sofre a agressão. Por exemplo, se o sujeito tem um pedaço de pau a seu alcance e com ele pode tranquilamente conter a agressão, o emprego de arma de fogo revela-se desnecessário” (CAPEZ, 2020, p. 529).
E A PROPORCIONALIDADE? Observe-se que o art. 25 do Código Penal, ao tratar da legítima defesa, embora estabeleça o requisito da moderação, não impõe o requisito da proporcionalidade. Assim, vem prevalecendo na doutrina o entendimento de que a proporcionalidade entre a repulsa e agressão não é imprescindível para a existência do meio necessário, de modo que, por exemplo, estará em legítima defesa aquele que, mesmo dispondo de um pedaço de madeira e de uma arma de fogo, ainda que podendo-se defender de maneira suficiente apenas com o pedaço de madeira, decide usar a arma de fogo não para matar, mas para amedrontar ou mesmo para causar pequenas lesões com coronhadas.
EXEMPLO DO PARALÍTICO: tal situação encaixa num cenário em que alguém, sendo paralítico, está na iminência de ser agredido com socos e, assim sendo, mesmo podendo defender-se com socos, usa-se de uma arma de fogo que porta para atirar no meliante e fazer cessar a injusta agressão. No caso, há legítima defesa porque não é razoável exigir do paralítico que se defenda somente com os próprios braços, dada a sua condição já dificultosa de defesa.
DESNECESSIDADE DO MEIO
A desnecessidade do meio caracteriza o excesso, que pode ser doloso, culposo ou exculpante (sem dolo ou culpa), conforme veremos à frente.
MODERAÇÃO
É o emprego dos meios necessários dentro do limite razoável para conter a agressão.
Não se deve medir a moderação de maneira milimétrica, afinal, quem está em situação de agressão atual ou iminente não tem plenas condições de raciocinar e decidir com precisão cirúrgica até que ponto deve agir sem se exceder. Contudo, também não se admite a banalização da legítima defesa, devendo sempre ser analisadas as circunstâncias de cada caso.
Por exemplo, o número exagerado de golpes revela imoderação por parte do agente, ainda que esteja se defendendo.
IMODERAÇÃO
Afastada a moderação, deve-se aferir se houve excesso.
EXCESSO
O excesso na legítima defesa é a “intensificação desnecessária de uma ação inicialmente justificada” (CAPEZ, 2020, p. 530). Se houver excesso, afasta-se a legítima defesa.
ESPÉCIES DE EXCESSO
1. EXCESSO DOLOSO OU CONSCIENTE
Segundo Fernando Capez, ocorre o excesso doloso ou consciente quando o agente, “ao se defender de uma injusta agressão, emprega meio que sabe ser desnecessário ou, mesmo tendo consciência de sua desproporcionalidade, atua com imoderação”, como no caso de alguém que, “para defender-se de um tapa, mata a tiros o agressor ou, então, após o primeiro tiro que fere e imobiliza o agressor, prossegue na reação até a sua morte” (CAPEZ, 2020, p. 531) – grifou-se.
No excesso doloso/consciente, há a intensificação racional da agressão, em que o agente age por motivos alheios à legítima defesa (ódio, vingança, perversidade etc.).
CONSEQUÊNCIA: o agente responde pelo resultado dolosamente.
2. EXCESSO CULPOSO OU INCONSCIENTE
Segundo Fernando Capez, ocorre o excesso culposo ou inconsciente quando o agente, “diante do temor, aturdimento ou emoção provocada pela agressão injusta, acaba por deixar a posição de defesa e partir para um verdadeiro ataque, após ter dominado o seu agressor”, sem que nesse contexto haja intensificação intencional, “pois o sujeito imaginava-se ainda sofrendo o ataque, tendo seu excesso decorrido de uma equivocada apreciação da realidade” (CAPEZ, 2020, pp. 531/532).
No excesso culposo/inconsciente, embora haja a intensificação da agressão, essa intensificação não é racional, eis que o agente imagina-se estar ainda sofrendo o ataque, de modo que o seu excesso decorre de uma equivocada apreciação da realidade.
Segundo Francisco de Assis Toledo, citado por Fernando Capez, são requisitos do excesso culposo/inconsciente:
i) o agente estar, inicialmente, em uma situação reconhecida de legítima defesa;
ii) dela se desviar, em momento posterior, seja na escolha dos meios de reação, seja no modo imoderado de utilizá-los, por culpa estrito senso;
iii) estar o resultado lesivo previsto em lei (tipificado) como crime culposo
CONSEQUÊNCIA: o agente responde pelo resultado a título de crime culposo, se existir.
3. EXCESSO EXCULPANTE
Segundo Fernando Capez, o excesso exculpante “não deriva nem de dolo, nem de culpa, mas de um erro plenamente justificado pelas circunstâncias (legítima defesa subjetiva)” (CAPEZ, 2020, p. 532).
Nesse caso, “o excesso da reação defensiva decorre de uma atitude emocional do agredido, cujo estado interfere na sua reação defensiva, impedindo que tenha condições de balancear adequadamente a repulsa em função do ataque, não se podendo exigir que o seu comportamento seja conforme à norma” (CAPEZ, 2020, p. 532).
O nome “exculpante”, nesse contexto, é criticado pela doutrina, porque, na realidade, não afasta a culpa e, ainda, também não afasta a ilicitude, afastando verdadeiramente o fato típico, porque elimina o dolo e a culpa.
CONHECIMENTO DA SITUAÇÃO JUSTIFICANTE
É necessário, para haver legítima defesa, que o agente conheça a situação de agressão injusta, atual ou iminente, pois, do contrário, estará afastada a excludente de ilicitude. Assim, se na mente do agente, ele queria cometer um crime e não se defender, por mais que estivesse em situação de agressão injusta, isso não afastará seu crime, ainda que, por coincidência, o seu ataque acabe sendo uma defesa. O fato ainda assim será ilícito (CAPEZ, 2020, p. 532).
COMMODUS DISCESSUS E INEVITABILIDADE DA AGRESSÃO
Como já vimos, no estado de necessidade não se admite o commodus discessus, ou seja, adotar a solução mais cômoda, sendo necessário que o agente atue para evitar praticar o fato típico, de modo que só haverá o estado de necessidade caso o agente não podia de outro modo evitar o perigo.
Já na legítima defesa, não há tal restrição em tal proporção, ou seja, não se exige que o sujeito, diante de uma situação de agressão atual ou iminente, seja covarde e fuja, autorizando-se que ele se defenda, ainda que pudesse fugir. Na legítima defesa, o sujeito pode optar pelo comodismo da fuga ou por defender-se de acordo com as exigências legais.
Alguns doutrinadores exigem, para a legítima defesa, que haja a inevitabilidade da agressão, de modo que, caso a agressão seja evitável, o agente não pode defender-se alegando legítima defesa.
Contudo, esse entendimento não é o que prevalece e, segundo Fernando Capez, não tem previsão legal, de modo que “a lei brasileira, contudo, não exige a obrigatoriedade de evitar-se a agressão (commodus discessus), pois, ao contrário do estado de necessidade, cujo dispositivo legal obriga à evitabilidade da lesão ao dispor ‘nem podia de outro modo evitar’, a legítima defesa não traz tal requisito em seu dispositivo, de modo que o agente poderá sempre exercitar o direito de defesa quando agredido” (CAPEZ, 2020, p.533).
HIPÓTESES DE CABIMENTO DA LEGÍTIMA DEFESA
LEGÍTIMA DEFESA CONTRA AGRESSÃO INJUSTA DE INIMPUTÁVEL
É o que ocorre, por exemplo, no caso de defesa contra um atentado cometido por louco ou por menor inimputável.
LEGÍTIMA DEFESA CONTRA AGRESSÃO ACOBERTADA POR QUALQUER OUTRA CAUSA DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE
É o que também o ocorre, por exemplo, no caso de defesa contra um atentado cometido por louco ou por menor inimputável, pois a pessoa tem o direito desse defender ainda que a agressão do outro porventura seja acobertada por qualquer outra causa de exclusão da culpabilidade.
LEGÍTIMA DEFESA REAL CONTRA LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA
Aquele que age defendendo-se de agressão de outrem, ainda que essa agressão seja acobertada pela legítima defesa putativa, ainda assim estará em legítima defesa.
EXEMPLO: José está caminhando na rua quando vê João, seu desafeto, e imagina erroneamente que João irá sacar uma arma para lhe matar. Assim, José se antecipa e saca sua arma para matar João, sendo que, então, João se antecipa e, aí sim, saca sua arma e mata José. Nesse caso, José estava em legítima defesa putativa, ao passo que João agiu em legítima defesa real, contra a legítima defesa putativa de José.
LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA CONTRA LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA
Segundo Capez, é o que ocorre “quando dois neuróticos inimigos se encontram, um pensando que o outro vai matá-lo. Ambos acabam partindo para o ataque, supondo-o como justa defesa” (CAPEZ, 2020, p. 535).
Nesse caso, objetivamente, os dois fatos são ilícitos, eis que não há legítima defesa real, mas se as circunstâncias concretas evidenciarem que ambos estavam em sincera crença de legítima defesa e tinham condições razoáveis para tal, ambos não cometerão crime, pois estarão em legítima defesa putativa, que exclui a culpabilidade.
LEGÍTIMA DEFESA REAL CONTRA LEGÍTIMA DEFESA SUBJETIVA
LEGÍTIMA DEFESA SUBJETIVA: é o excesso por erro de tipo escusável, que ocorre quando o agente, após se defender de agressão inicial, começa a se exceder, pensando ainda estar sob ataque, sendo que, na sua mente, ele está se defendendo, porque a agressão ainda não cessou, mas, na realidade, objetivamente, já deixou a posição de defesa e passou ao ataque, legitimando a repulsa por parte de seu agressor.
Em teoria, seria possível ao agressor, então, defender-se da legítima defesa subjetiva, mas somente pode fazê-lo sem ferir aquele que está se defendendo.
EXEMPLO: um estuprador que, levando a pior, começa a ser esfaqueado pela moça que atacara. Nesse caso, o estuprador até pode se defender das facadas, mas tem que fazê-lo sem ferir a moça, pois, do contrário não estará abrangido pela legítima defesa, afinal, seria um contrassenso lógico que se admitisse que ele pudesse matar a moça, que há pouco tentara subjugar. No caso, ou o estuprador desarma a moça sem machucá-la, ou responde pelo que vier a acontecer a ela (CAPEZ, 2020).
LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA CONTRA LEGÍTIMA DEFESA REAL
É possível, sendo que o fato será ilícito, pois objetivamente injusto, mas a culpabilidade será excluída.
EXEMPLO: Carlos presencia seu amigo brigando e, para defendê-lo, agride seu oponente, sendo que mal sabia Carlos que na verdade o amigo era o agressor, sendo que o terceiro apenas se defendia. Nesse caso, Carlos terá praticado legítima defesa putativa contra a legítima defesa real exercida pelo terceiro.
LEGÍTIMA DEFESA REAL CONTRA LEGÍTIMA DEFESA CULPOSA
EXEMPLO: se Marcos, confundindo Pedro com seu desafeto e sem qualquer cuidado de certificar-se disso, efetua diversos disparos em sua direção. Há, aqui, uma agressão injusta decorrente de culpa na apreciação da situação de fato. Se Pedro se antecipa e mata Marcos, Pedro terá agido em legítima defesa real contra legítima defesa culposa.
QUESTÃO PROCESSUAL: QUESITAÇÃO DA LEGÍTIMA DEFESA
Atualmente, no rito do Tribunal do Júri, em regra, todas as teses defensivas são reunidas num só quesito: “o jurado absolve o acusado?”. Assim, não há quesito separado para a legítima defesa.
OUTROS CONCEITOS
LEGÍTIMA DEFESA SUCESSIVA
É a repulsa contra o excesso. “Uma ‘legítima defesa’ após a outra”. Ocorre que, como já vimos, quem dá causa aos acontecimentos não pode arguir legítima defesa em seu favor, devendo dominar quem se excede sem feri-lo (CAPEZ, 2020).
LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA
Segundo Capez, “é a errônea suposição da existência da legítima defesa por erro de tipo ou de proibição”, só existindo “na imaginação do agente, pois o fato é objetivamente ilícito” (CAPEZ, 2020, p. 538). Como vimos, é o caso do indivíduo que, vendo seu desafeto na rua, o qual já lhe jurou de morte, saca uma arma acreditando que está se antecipando ao outro (que pensa querer matá-lo ali), quando, na verdade, o outro apenas iria entregar-lhe uma Bíblia dizendo que mudou de vida e que aceitou Jesus Cristo como seu salvador. No caso, o primeiro indivíduo agiu em legítima defesa putativa.
LEGÍTIMA DEFESA SUBJETIVA
É o excesso derivado do erro de tipo escusável, que exclui o dolo e a culpa.
LEGÍTIMA DEFESA RECÍPROCA
Segundo Capez, “é a ocorrência de legítima defesa contra legítima defesa, o que não é admissível, exceto se uma delas ou todas forem putativas” (CAPEZ, 2020, p. 539) – grifou-se.
LEGÍTIMA DEFESA PRÓPRIA E LEGÍTIMA DEFESA DE TERCEIRO
Segundo Capez, “a legítima defesa própria ocorre quando o agente salva direito próprio” e, em oposição, “a legítima defesa de terceiro se dá quando o sujeito defende direito alheio” (CAPEZ, 2020, p. 539).
ABERRATIO ICTUS NA REAÇÃO DEFENSIVA
Aberratio ictus é o erro na execução e, no caso, é o erro na execução dos atos necessários da defesa.
EXEMPLO: para defender-se da agressão de Henrique, Ademar desfere tiros em direção a ele, mas, por erro, atinge Josias, terceiro inocente. Ademar está amparado pela legítima defesa e assim estaria ainda que os tiros atingissem, além de Josias, também Henrique, já que, de acordo com o art. 73 do Código Penal, responderá pelo fato como se tivesse atingido quem quis atingir, ou seja, responderá como se tivesse atingido a pessoa visada e não a efetivamente atingida.
LEGÍTIMA DEFESA E TENTATIVA
É perfeitamente possível
“LEGÍTIMA DEFESA DA HONRA”
Atualmente, como vimos, não mais vale, por si só, para absolver o réu, sob pena de ser uma decisão manifestamente contrária à prova dos autos, passível de recurso pelo Ministério Público (CPP, art. 593, III, “d”).
DIFERENÇAS ENTRE LEGÍTIMA DEFESA E ESTADO DE NECESSIDADE
ESTADO DE NECESSIDADE | LEGÍTIMA DEFESA |
há um conflito entre dois bens jurídicos expostos | há uma repulsa a ataque |
o bem jurídico é exposto a perigo | o direito sofre uma agressão atual ou iminente |
o perigo pode ou não advir de conduta humana | a agressão só pode ser praticada por conduta humana |
a conduta pode ser dirigida contra terceiro inocente | a conduta pode ser dirigida somente contra o agressor |
a agressão não precisa ser injusta, como no caso dos náufragos que se agridem disputando a única boia | só existe se houver injusta agressão |
ATENÇÃO: é possível a coexistência entre estado de necessidade e legítima defesa, como no caso de uma pessoa que, buscando defender-se legitimamente de outra, pega a arma de uma terceira, não praticando o furto da arma por estar em estado de necessidade.
REFERÊNCIAS
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: 24ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020 – versão digital.
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