O crime pode ser conceituado sob três enfoques:
i) conceito material: considera-se “todo fato humano que, propositada ou descuidadamente, lesa ou expõe a perigo bens jurídicos considerados fundamentais para a existência da coletividade e da paz social” (CAPEZ, 2019, p. 179);
ii) conceito formal: considera-se crime “tudo aquilo que o legislador descrever como tal, pouco importando o seu conteúdo” (CAPEZ, 2019, p. 180).
Problema do conceito formal e os princípios da intervenção mínima, da insignificância e da fragmentariedade: o conceito formal de crime, segundo Fernando Capez, atenta contra esses princípios pois considera uma conduta como criminosa simplesmente porque assim é definida na lei, sem se preocupar se tal conduta é lesiva ao ponto de justificar a intervenção do Direito Penal (intervenção mínima), lesiva de maneira significante (insignificância) e lesiva de modo a justificar a incidência do Direito Penal na integral proteção de determinado bem jurídico (fragmentariedade).
iii) conceito analítico: busca-se estabelecer, sob um prisma jurídico, os elementos estruturais do crime, levando em conta tanto o conceito material quanto o conceito formal, mas não se restringindo a nenhum deles isoladamente. Assim, pelo conceito analítico, crime é, no mínimo, um fato típico e ilícito (concepção bipartida), podendo ser exigido também o elemento de ser culpável (concepção tripartida) ou, em acréscimo, também o elemento de ser punível (concepção quadripartida).
CONCEPÇÕES BIPARTIDA, TRIPARTIDA E QUADRIPARTIDA DE CRIME
CONCEPÇÃO BIPARTIDA
Segundo a concepção bipartida, crime é um fato típico e ilícito, pouco importando, para haver crime, se há culpabilidade e/ou punibilidade.
São adeptos dessa concepção: Damásio de Jesus, Fernando Capez, Celso Delmanto, Renê Ariel Dotti, Julio Fabbrini Mirabete, Flavio Augusto Monteiro de Barros, José Frederico Marques, Renato Nalini Fabbrini, Maggiore, Cleber Masson, entre outros.
Argumentos segundo os quais o conceito de crime adota, no Brasil, a concepção bipartida, de acordo com Damásio de Jesus, citado por Fernando Capez:
i) nosso Código Penal, quando trata do fato típico, diz que não há crime sem lei anterior que o defina (CP, art. 1º) e, quando trata da ilicitude, diz que não há crime quando há excludente de ilicitude (CP, art. 23), mas, por outro lado, quando trata da culpabilidade, nosso Código não diz que não há crime, mas sim que esse crime não é punível. Assim, a punibilidade não é requisito do crime;
ii) nosso Código Penal, ao dizer que receptação é adquirir coisa que sabe ser produto de crime (CP, art. 180), não afastou a possibilidade de se caracterizar como receptação a conduta de adquirir coisa que sabe ser produto de ato infracional cometido por menor (roubo, por exemplo), já que, como sabemos, menor não comete crime e sim ato infracional.
CONCEPÇÃO TRIPARTIDA
Segundo a concepção tripartida, crime é um fato típico, ilícito e culpável. Assim, para essa concepção, se não há culpabilidade, não há crime. A culpabilidade, então, é elemento do crime.
São adeptos dessa concepção: Cezar Bitencourt, Edgard Magalhães Noronha, Francisco de Assis Toledo, Heleno Fragoso, Aníbal Bruno, Frederico Marques, Nelson Hungria, Juarez Tavares, Guilherme Nucci, Paulo José da Costa Júnior, Luís Régis Prado, Rogério Greco, Fernando Galvão, Hans Welzel, João Mestieri, David Teixeira de Azevedo, entre outros.
Argumentos segundo os quais o conceito de crime adota, no Brasil, a concepção tripartida, de acordo com Luís Flávio Gomes, citado por Guilherme de Souza Nucci:
i) não se pode considerar crime um fato meramente típico e ilícito, mas que não seja censurável (culpável). Se não há censura na conduta (culpabilidade), não há crime;
ii) para haver crime, deve haver ameaça de pena propriamente dita (e não, por exemplo, de outro tipo de sanção), de modo que se a culpabilidade afasta a possibilidade de aplicação de pena, acaba por afastar, também, o próprio crime.
CONCEPÇÃO QUADRIPARTIDA
Segundo a concepção quadripartida, crime é um fato típico, ilícito, culpável e punível. Sem qualquer desses elementos, segundo essa concepção, não há crime.
São adeptos dessa concepção: Basileu Garcia, Claus Roxin e outros.
ATENÇÃO: a concepção quadripartida não é adotada no Brasil, não havendo sequer divergência doutrinária relevante sobre isso. O nosso Código Penal de nenhum modo adotou essa teoria e aqui a estudamos apenas para fins acadêmicos.
REFERÊNCIAS
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 1, parte geral: 24ª ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020 – versão digital.
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